Estamos prestes a dar um passo muito importante para combater a pandemia do COVID-19 que assola o mundo. Sim, estamos falando do início da fase de vacinação que, afastando-se das polêmicas disputas políticas travadas, deve acontecer em breve.
É fato que a maioria dos brasileiros esperam por uma vacina que seja eficaz. Entretanto, há muitos cidadãos que, por motivação pessoal (filosófica, religiosa ou, até mesmo por teimosia) já declararam que não vão se vacinar, uma vez que não acreditam no caráter profilático anunciado pelos laboratórios.
Em oposição à corrente negacionista, recentes decisões do Supremo Tribunal Federal entenderam ser constitucional que estados e municípios determinem a vacinação obrigatória de seus tutelados, desde que se abstenham de adotar medidas compulsórias para obrigar o cidadão a submeter-se a vacina.
Estados e municípios, por meio de leis e atos normativos, possivelmente devem criar restrições àqueles “recalcitrantes”, os impedindo de adentrar a determinados espaços ou restringindo direitos que eventualmente tenham. Algo semelhante ao que acontece quando os cidadãos não votam (que também é obrigatório no país) e acabam sofrendo algumas restrições.
Mas, surge uma questão no âmbito privado que, com certeza, será enfrentada pelos empregadores: posso demitir, por justa causa, o trabalhador que se recusa a ser vacinado?
Tal questão já vem sendo debatida no mundo jurídico e as opiniões não são unânimes.
Por um lado, juristas lembram que o empregador tem a obrigação legal de manter um ambiente de trabalho seguro. Para isto, submetem-se a uma série de regramentos relativos à saúde, higiene e segurança no ambiente de trabalho, sendo certo que, se delas se afastar, sofrerá as punições legais.
Somado a isto, existem também questões de direito coletivo e de saúde pública, as quais se sobressaem quando em oposição a liberdade individual. Veja que durante esta pandemia muitos chefes do Poder Executivo decretaram limitações em relação ao direito individual de ir e vir, sempre para garantir a saúde da comunidade e a higidez do sistema de saúde público e, em muitos casos, do sistema de saúde privado.
Além disso, a contaminação do trabalhador por COVID no ambiente de trabalho vem sendo considerada como acidente de trabalho, o que gera obrigações para o empregador (como por exemplo a estabilidade acidentária por 12 meses e a possibilidade de ter que indenizar o trabalhador pelos danos sofridos). Tal situação também reforça a preocupação e necessidade de atuação do empregador, para evitar a disseminação da doença no ambiente de trabalho.
Ainda, há de ser considerado a possibilidade dos trabalhadores que receberam a vacina se recusarem a trabalhar com aqueles que não querem ser vacinados, o que implicaria em movimentos internos e na diminuição da produção ou na efetividade dos serviços prestados, restando prejuízo para o empregador.
Assim, numa rápida análise, muito embora tal condição não esteja prevista na CLT, parece ser possível e razoável a aplicação da penalidade de justa causa ao trabalhador que recuse a receber a vacina contra o COVID 19 neste tempo de pandemia, na medida que sua recusa ofende os citados preceitos protetivos.
Por outro lado, há uma corrente jurídica em sentido oposto, a qual considera que a dispensa por justa causa pela recusa de receber a vacina contra o COVID-19 revelaria uma conduta discriminatória por parte do empregador, gerando o direito do empregado ser indenizado, posteriormente, por danos morais.
Apoiando essa corrente, também deve ser levado em conta que a demissão por justa causa é restritiva, ou seja, somente pode ser aplicada nos casos previstos em lei (e ainda não há legislação que permita a demissão por motivo de negativa de ser vacinado, muito embora em determinadas atividades se exija a apresentação do comprovante de vacinação).
Em alternativa à demissão por justa causa, de maneira menos enérgica, é possível ao empregador que mantenha o seu empregado longe do ambiente de trabalho, caso ele não “tome a vacina”, o mantendo em home office, quando a atividade exercida possibilitar isto, com a manutenção de seu salário. Ainda, pode tal trabalhador ser compelido a realizar exames médicos com mais frequência, como forma de acompanhar eventual contaminação e ter maior controle sobre a situação. Por fim, também é possível a demissão sem justa causa e por iniciativa do empregador, situação esta que imporá que todos seus direitos trabalhistas sejam indenizados, mas que pode vir a ser mais barata do que ter diversos funcionários afastados ou sofrendo “acidentes de trabalho” pela contaminação.
Em síntese: muito há de se discutir e nada está definido. Assim sendo, recomenda-se aos empregadores que acompanhem o desenrolar desta pandemia e desta discussão, especialmente porque, com certeza, normas para regular tal questão devem ser publicadas nos três níveis da Federação e devem ser consideradas quando a vacinação da COVID se iniciar.